terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Passou...

Eu estava distraída, descompromissada com o raciocínio, olhando as faixas da estrada. Foi aí que surgiu no retrovisor aquela imagem. Atrás de mim vinha veloz o passado, arrebatando a respiração, provocando a imaginação, galopando sem respeito por cima dos meus desejos simples.
Ilógica e diabólica coincidência, logo hoje que a melancolia se apossa de mim. Nas curvas procurei encaixar nossos olhares, o estranho hoje e o nosso futuro improvável. Possíveis são as escolhas, desenfreadas as paixões, absurdas as ilusões. Veio então uma boa e dura real reta, dessas que se ultrapassam caminhões gigantescos, e você num vulto instante passou por mim... Da janela eu vi alegrias acopladas no seu sorriso iluminado. Passou por mim, como se não me visse e não me viu, nem me invadiu como almejava, nem me feriu a carne mas dilacerou a alma. Cortou em pedaços as lembranças e esperanças tolas. Você passou por mim, não como um raio mas como um clarão de tarde de sol. Eu senti calor quando você passou, e náuseas recorrentes na medida em que apertava o peito aquele ar que se deslocou no tempo quando você cortou pela esquerda de mim. Entrelacei as mãos já convencida do repentino desespero da sua ultrapassagem, era amarga aquela imagem do passado que passou, ultrapassou e virou distância ali bem na minha frente...
Você aos poucos se distanciou, distanciou... Passou na pressa certa por mim e não me viu, ultrapassou no momento que deixou de existir para mim.
Amadurecida? Convencida? E foi se distanciando nas curvas, distanciando, me deixando pra trás nas retas e também nos quebra-molas. Eu permaneci impotente na velocidade cravada de 90km por nada, sozinha no vazio tosco da mudez, do pensamento esmagado do castelo aerado. Sumiu sem rastros, sem trevos nem desculpas. Chegamos ao mesmo destino em horários diversos e vidas distintas, um desencontro com ponto final, sem voltas e agora sem sonhos. Quando você passou por mim eu vi alegrias acopladas no seu sorriso iluminado, daquelas que um dia deixou em mim fogos de artifício. ‘2009’ assim passou, ultrapassou e sumiu na estrada.

Obrigada a todos que passaram por esta 'Ambição Literária' em 2009. Para 2010 ambiciono 'revê-los' por estes versos... Muita fé, saúde, paz no coração, coragem para se reinventar nos dias ruins, mais realizaçãoes e menos 'sonhar'. É o que desejo pra mim e para você!

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Coisas de natal



Há 2009 anos nasceu um cara, numa tal de manjedoura numa gruta. O cara era pobre, sua mãe estava fugindo de uma perseguição sei lá, e ele foi nascer nesta gruta que servia de abrigo para animais nos arredores de Belém. Por causa disto se estabelece uma atmosfera diferente nesta época do ano. Enfeita-se a casa, as lojas, as ruas e praças. Junta-se a família, vem a parentada toda de não sei onde para uma ceia ou almoço. Organizam-se festas, confraternizações e sorteios de amigo-ocultos. É uma agitação, uma arrumação, compras sem fim, trânsito engarrafado, fila no estacionamento do supermercado, horas para achar uma vaga no shopping... Um reboliço, uma correria, uma gostosa enorme confusão! Olha que coisa mais maluca. Porque isso? Porque o cara falava de amor ao próximo, de se doar simplesmente, de fazer o bem, e por isso sua fama correu o tempo, vem se arrastando, se perpetuando de geração em geração durante séculos.
No nascimento do cara apareceram três reis magos vindos de muito longe guiados por uma estrela e trazendo presentes. Daí a tradição da troca de presentes. O ato de presentear faz o próximo feliz. Veja bem que o ‘presentear’ não passa só pelo material ele pode ser bem maior e fazer ainda mais feliz quem for agraciado, é o tal amor ao próximo. Para quem não tinha condições um bom velhinho, séculos atrás, distribuía presentes que ele mesmo confeccionava. A indústria cultural embarcou nesta lenda e criou com sucesso a figura do Papai Noel, com roupa vermelha pra ser associado à marca de um refrigerante. Daí quando a gente é criança acredita que é ele que nos oferta os presentes desde que o nosso bom comportamento seja aprovado. Mas tudo isso é por causa do cara, que falava de amor, não esqueça.
E natal tem um monte de coisas engraçadas, um monte de lembranças alegres para muita gente e outras nem tanto para uma outra porção de gente. Eu lembro de um natal muito festivo, quando eu tinha uns 7 ou 8 anos, nossa casa cheia com a tal parentada, minha mãe e minhas tias na cozinha o dia todo falando, gesticulando, rindo, fofocando e também preparando a ceia. O salpicão era trabalhoso, tinha que picar tudo aquilo, desfiar frango, e imaginem, ainda fritar muita batata palha porque naquele tempo não existiam ainda os saquinhos com batata palha já pronta. E onde iam misturar todos aqueles ingredientes? Era preciso uma bacia grande e na falta de uma, alguém deu idéia de usar a gaveta da geladeira. Entre muitas gargalhas assim foi feito. As carnes, como a leitoa, iam assar no forno da padaria, a sobremesa era a mesma de todos os anos e não se poderia deixar de fazer o tradicional ponche. Essa era a parte que minha mãe e minhas tias mais se divertiam, pareciam bruxas animadas e risonhas inventando uma poção mágica. Levava guaraná, eu acho, frutas picadas, a calda que sobrou do pêssego que enfeitou o peru, a calda que restou da cereja que enfeitou o pêssego do peru, e espumante, ou pinga mesmo, porque não? Como ele ficava bonito naquela poncheira de cristal, e à medida que a noite ia adentrando, a conversa ia se elevando, as risadas pipocando, o ponche ia sumindo. Eu lembro que flagrei minha avó colocando presentes debaixo da árvore e indiretamente me revelando cruelmente a verdade: Papai Noel não existe.
Também lembro de um dia de natal baixo astral, que passei sozinha, fui almoçar num restaurante, o mesmo tava fechado, ainda por cima começou a chover e eu não levei guarda-chuva. Ah que bom que as boas lembranças rederam mais versos, muito mais encantadores do que a sem graça ou até engraçada frase da lembrança triste!
Tudo isso é por causa do ensinamento simples e essencial que varreu a humanidade, tocou milhões de corações no mundo todo seja lá como for. É o amor ao próximo que o cara recitou em parábola. E mais uma vez se mantêm a tradição de estar com as pessoas queridas para lembrar e celebrar isto, com enfeites, publicidade, caridade, presentes, engarrafamento, salpicão na gaveta da geladeira, roupa nova, correria e chuva, é natal! Parabéns, feliz aniversário Jesus, você é o cara!

Foto: Ornamentação de natal no Largo do Rosário, por Karlinha

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Sandra, Sandrão, Drão

O Gilberto tava meio mal de grana com poucos shows agendados, a censura do regime militar ainda na sua cola, e o pior, estava aborrecido pois sua mulher, Sandra, queria a separação. Enfim, o momento era difícil, mas não era de se recusar convites ou trabalhos por mais estranhos e longe que parecessem. E depois de tanto excursionar pelo exterior e ter um programa especial só dele na TV Globo, Gil foi convidado para ser jurado de um programa de auditório numa rádio no interior de Minas. Era o início dos anos 80, havia aos domingos um programa de calouros muito popular no auditório da Rádio São João, em São João Del Rei. O então diretor da rádio (não lembro o nome e não quis inventar nenhum!) numa visita à capital mineira encontrou por acaso, na Cantina do Lucas, um grande amigo e escritor. Este por sua vez estava com um ilustre amigo, o cantor baiano Gilberto Gil e assim se deu a coisa, o diretor que desejava promover o programa da rádio se entusiasmou, o convite foi feito e o cantor aceitou, aguçado pela curiosidade de conhecer a histórica cidade. Foi oferecido carro com motorista no dia seguinte, mas Gil dispensou e disse que não fazia questão da mordomia, foi logo naquele mesmo dia de ônibus numa linha intermunicipal normal. Já no terminal rodoviário, que ironia, a empresa da linha 'Belo Horizonte-São João del Rei' chamava-se ‘Viação Sandra’. Entrou no ônibus que não tinha luxo algum e como sempre fazia, logo cumprimentou o motorista: -E aí baiano? O motorista replicou ainda não reconhecendo o afamado artista: -Bom dia amigo, mas eu não sou baiano não... -Mas é que eu sou, e chamo todo mundo de baiano também, não se zangue não... -disse o cantor com sotaque carregado. O trocador se intrometeu na conversa e falou ao motorista sorrindo: -Mas até que você tem cara de baiano mesmo... Todos riram e foi este o apelido com que o motorista ficou conhecido dali em diante. Curva do Sabão, viaduto das Almas, à frente de Gil num encosto de cabeça, a palavra “SANDRA” em letras verdes. Ele ficava lendo sem parar aquele nome e relembrando toda sua vida com a mulher, o período do exílio em Londres, o nascimento dos três filhos e todas as dificuldades, agruras e alegrias que dividiram. Na parada à beira da BR040, na localidade de Murtinho, comeu meio sem vontade um pastel de carne. Achou graça do mineiro ‘Maranhão’, nome do lugarejo próximo à Congonhas do Campo, onde Sandra estacionou para descer um passageiro. Deliciou-se com a simplicidade da cidadezinha de São Brás do Suiaçuí e ficou imaginando que Drummond teria escrito o pequeno poema‘cidadezinha qualquer’ inspirado naquelas ruas de São Brás do Suaçuí... Suaçuí... Suaçuí. “Que gostoso de pronunciar” pensou. Sandra prosseguiu e parou novamente, agora na Terra do Fogo, onde embarcou uma velhinha de lenço na cabeça, carregando alguns sacos de sementes, uma sacola e uma trouxa de pano. Um dos sacos era de feijão e este já ficou na cabine do motorista (o Baiano!) que lhe pagou por ele. Depois que se acomodou, lançou da sacola um queijo embrulhado em saco plástico e saiu oferecendo aos passageiros: -Qué compra quêjo? Tem fresquim e curadim -foi repetindo a senhorinha ao longo do corredor. Gil logo se interessou, queria levar um queijo de minas! Mas quis saber a diferença: - Como é curadim e como é o fresquim? - Indagou à senhora. -O fresquim ainda mina água e o curadim já tá mais firmim. Tudo produzido na minha roça mesmo - explicou sorridente. Veio Desterro de Entre Rios, Sandra freou. Como seria um desterro no meio de rios, que emaranhado de caminhos eram esses? Gil pensou. E logo depois Sandra fez parada novamente, desta vez em Entre Rios de Minas, sem desterro e berço da raça Campolina foi o que Gil leu numa placa pequena pregada numa cerca branca. Já outras placas enormes estariam por vir nas diversas curvas que se seguiram, elas surgiam assustando e anunciando com letras gigantes ‘o legítimo rocambole’, ‘o famoso rocambole’ de Lagoa Dourada. O cantor lembrou logo de sua filha Preta, louca por doces. Será que Sandra iria parar naquela terra do bolo com doce de leite em forma de caracol? Claro, Sandra pára em todo lugar, lugarejo, vilarejo, ponto, porta, porteira, clareira, fogueira, bananeira. Basta balançar o braço, erguer a mão e Sandra pára... Ás vezes Gil esperava que ela fosse parar até quando um galho de árvore balançasse na beira da estrada! Mas ele não se arrependeu um instante se quer de não ter aceitado a carona do diretor, ele estava apreciando aquela um tanto demorada viagem, as pitorescas paisagens daquelas bandas, aquela gente simples entrando e saindo, e “SANDRA” sempre segurando seu olhar o fazendo matutar, reviver o passado e imaginar o futuro. Aqueles ares fizeram muito bem a Gil. Ele compreendeu que não poderia mais segurar aquele enlace com Sandra - Drão como ele carinhosamente a chamava - e resolvera aceitar a separação sem mágoas. Estava inspirado, renovado e tinha pronta em suas mãos, letra e melodia, a canção que fez naquela viagem e que seria um de seus maiores sucessos! Já o programa na rádio... Bem, Gil apesar de achar a cidade encantadora, só pensava na viagem de volta quando iria comprar para Preta Gil alguns três ou quatro rocamboles, também queijo ‘curadim’ e outro ‘fresquim’. Queria olhar de cabeça erguida para “SANDRA” na poltrona da frente, consciente de que tudo passa entre uma parada e outras tantas e o que foi vivido permanece nos corações. A vida segue seu rumo torto e às vezes reto e sereno. A estrada escura, a caminhada dura ainda permanece para os são-joanenses que volta e meia, vão à capital, na companhia de Sandra ou não. A paisagem dos campos das vertentes como vista, um açucarado legítimo bolo-rolo numa suposta dourada lagoa, uma passada sem graça e longe dos profetas em Congonhas, um suspiro que escorrega e se perde na curva do Sabão, uma saudade que cai vitimada do viaduto das Almas. Isso tudo, a não ser, que agora você pegue o avião. Saudosista que sou, ainda prefiro ir de BH à São João, e vice-versa sem pressa, pensando de leve sobre a vida, olhando tudo da janela de Sandrão!!!

Fim da história. Entrou por uma porta e saiu por outra, quem quiser que conte outra!

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Bastardos inglórios



- A primeira coisa que tenho para dizer do filme é que ele é bem... Tarantino. Tem todas aquelas ceninhas 'tarantinas' com congelamentos e caracteres no meio da trama, musiquinhas 'tarantinas', enredo amarrado 'tarantinamente', e -como não poderia faltar-sangue, seja jorrando, seja expirrando, escorrendo ou espalhado pra todo lado.

-O Brad Pitt continua um espetáculo e um ator forçado.

-Uma excelente atuação é a do ator Christophe Waltz, que interpetra Hans Landa, um coronel nazista caçador de judeus.

-Adorei os modelitos da atriz e espiã Bridget Von Hammersmark, principalmente o da noite de estréia do filme alemão num pequeno cinema de Paris: o vestido preto, a estola de pele branca de algum pobre animalzinho e a orquídea phalaenopsis no cabelo! Show!

- Enfim, saí do cinema com um nozinho de leve na garganta, um sentimento meio isquisito, o que significa que a arte da telona me tocou mais uma vez e o filme é bom.

P.S.: Sempre achei leite meio indigesto e vou desconfiar de pessoas que nunca tiram seus chapéus, boinas e bonés.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Fla x Flu

Eu sou Cruzeiro! Não porque meu pai era, mas minha mãe! A primeira vez que fui ao estádio do Mineirão foi ela quem me levou junto com minha madrinha. Como descrever aquela sensação única de se ver o gramado enorme, verde e iluminado, a torcida unida num só grito, tudo pela primeira vez! Não se esquece. E era assim, na minha família as mulheres eram as maiores entusiastas do futebol. Reza a lenda familiar que minha avó materna certa vez estava um tanto exaltada com o juiz do clássico ‘Minas e Athletic’ e acabou sendo expulsa do campo.
Meu pai preferia falar de outras coisas e fazer outras coisas muito mais importantes, de acordo com seu julgamento, que torcer para um time. O que ele mais temia numa roda de amigos era que se começasse a discutir sobre as ‘últimas’ do esporte, ele certamente ficaria sem dar opinião. Durante uma partida em que todos estivessem ligados na TV reclamando enfurecidos um pênalti não marcado ou um chute pra fora, meu pai se limitava a dizer, sei lá porque: “Joga no miolo, tem que jogar no miolo”. Mas da época da Copa ele gostava, mas só porque gostava de festa.
Bom, mas pela minha mãe e pelos meus três irmãos, desde pequena eu gosto de futebol. Como é de tradição são-joanense, dois de meus irmãos torciam pelos times do Rio, um flamenguista e o outro tricolor, lembrando que o coração de todos era azul. E daí começou meu fascínio pelo clássico carioca mais comentado, mais charmoso, tenso, cheio de mandingas e histórias, o mais descrito por jornalistas como Mário Rodrigues Filho e posteriormente por Nelson Rodrigues: o FlaxFlu. A partida que mais atrai as multidões, que mais vende jornais e rende audiência. Gigante, pungente, o duelo bateu o recorde mundial de público em partidas entre clubes com 194.603 espectadores, na final do Campeonato Carioca de 1963.
Nem ‘Grenal’, muito menos ‘Bavi’ ou até mesmo o temido ‘atlético e cruzeiro’ me arrebata tanto.
Vejo a torcida rubro-negra loucamente apaixonada, aguerrida, atrevida, um amor sem regras e pudores, cheio de altos e baixos, mas presente e eterno.
Já a torcida ‘pó de arroz’ do Fluminense parece-me adorar com um sentimento mais centrado, pés no chão, contida e ausente por vezes e quando convém explosivamente e elegantemente eufórica. Posso comparar o Fla x Flu ao inesgotável debate entre e a emoção e a razão, a paixão e a lucidez. A turma do urubu é marginalizada, abrangente nas classes desfavorecidas, já a do cartola está acima, como se descendesse de família nobre, vista num pedestal social que ninguém sabe como foi alcançado.
Ah como é delirantemente tentador o furor de um flamenguista e como é agradavelmente pacificador o carinho de um tricolor!
Lamartine Babo me sentenciou que uma vez flamengo, sempre flamengo, flamengo sempre hei de ser, é meu maior prazer. Mas também deixou claro que sou tricolor de coração, sou do clube tantas vezes campeão, fascina pela disciplina, o fluminense me domina.
Nas alturas do campeonato para qual time você torce? Para o rubro-negro chegar ao G4 ou para o tricolor não ser rebaixado (se é que isto ainda é possível)?
Eu? Eu sou Cruzeiro!!!

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Legado


Belo Horizonte: A silhueta dos prédios na avenida Raja Gabaglia com o pôr do sol. Belo! Sion e três vezes Santo Antônio. Meu irmão e o Mineirão. Doloroso e solitário. Talvez por ser a primeira, talvez por estar tão perto de São João del Rei, mas a capital mineira foi para mim árdua adaptação. Mas eu fiz quatro intensas e perpétuas amizades: Angélica, Denise, Márcia e Juliana! Aprendi a comer brócolis com a Josi, estudei publicidade, jornalismo e ganhei diplomas.
Resende: As águas ligeiras do Rio Paraíba do Sul vistas da minha janela. Da minha janela os carros velozes da Via Dutra. A vida não pára e a Dutra também não. Ao redor, altas montanhas e a cidade de Penedo com colonização Finlandesa. Na sala do apartamento pintei uma parede de verde. Fiz duas ou três amizades, aprendi fazer desenhos com o CorelDraw, aprendi um pouco de francês.
Lorena: Como a gente foi parar naquela cidade, onde ficava? Ficou saudades pra mim! Eu adorei aquele lugar pacato do interior de São Paulo. Ali parou para descansar o bendito desbravador taubateano Tomé Portes del Rei, para seguir para as Minas Gerias, e depois fundar São João del Rei. Carrego comigo o gosto do pastel de nata, o ar fresco que corria na casa antiga de teto alto e grandes janelas, a amizade de Marlene, e a sabedoria de gente simples que me ensinou a bordar. Fiz mais uma ou duas amizades e com Betina aprendi que calda de chocolate fica mais suave com creme de leite! Continuei a aprender francês. Na sala eu pintei uma parede de verde, no quintal derrubamos o muro que tampava o jardim, plantei grama e hortelã. O quintal era grande e vazio então veio o meu bulldog, Monti. E tudo ficou pleno. Um banheiro antigo cor de rosa, ficou suave e branco. As mangueiras por trás dos muros anunciavam as estações, o pé de acerola carregado de preciosos frutos adocicava com acidez o paladar, o meu coração provou do sossego como poucas vezes.
Rio de Janeiro: O subúrbio. Uma outra visão de cidade maravilhosa. Tudo longe e muito perto, minha prima amada. Eu tinha a praia, e almoços de domingo na sogra. Eu conquistei a mais importante das conquistas, uma amizade sincera e rica, uma alegria de viver ao lado de Priscila. Nas palestras do curso para ‘atualização da mulher’ aprendi muito mais que o ensinado, a lição foi dada pela convivência com outras meninas, de tantos outros lugares. Aprendi a correr, ganhei minha primeira medalha e um secador da cabelos.Na sala do apartamento eu não pintei uma parede de verde, porque seria só um ano.
Vila Velha: Linda! Tão sonhada... estou aqui agora! E posso fazer tudo diferente, embora já tenha pintado uma parede de verde e outra de lilás no quarto. Fizemos uma grande reforma, fiz uma ou duas amizades. Pratico Pilates, tenho a praia perto, a visão onipresente do Covento da Penha, muita poeira com minério da Vale, um vento desconcertantemente freqüente e um calor que eu adoro!
‘Nossa casa é nossa casa em qualquer lugar, basta fechar a porta’ disse uma vez um amigo também nesta vida de mudanças. Mas e nós? Somos os mesmos? Não desejo fechar a porta para os lugares em que habito. É preciso se doar, se reinventar, se deixar ser invadido, conquistar, passear por adjacências, conhecer gente, costumes, provar sabores. Aprendi que melhor que deixar paredes coloridas é deixar um pouco do que tem de bom dentro de si, dividir um ensinamento, um sentimento, e viver uma amizade com toda sua poderosa força! Essa amizade não é sempre que se encontra, mas me comprometo sempre a tentar!
Será que em algum destes lugares alguém aprendeu alguma coisa boa, tirada da minha essência? Deixei escapar algumas atitudes provenientes das minhas qualidades e será que alguém recolheu algo apropriado? E se eu, na condição de frágil ser humano, por ventura deixei cair de mim sentimentos pequenos, e provoquei mágoas e rancores, eu peço a Deus que eu não os repita jamais!
Sigo na mudança, para onde o destino convidar, na esperança de aumentar a fé e a generosidade, de deixar mais e poder voltar para minha São João del Rei com uma pesada bagagem de lembranças únicas e com o corpo leve. E eu rertornarei porque é em São João del Rei que está minha família, meus eternos amigos são-joanenses, meu lar sem paredes e portas. Onde eu caminho, respiro, e sorvo com toda força do meu ‘eu’ verdadeiro que está em cada esquina, em cada banco de igreja, em cada melodia ressonante do período colonial, nas montanhas do Lenheiro, o 'eu' mineiro sempre, intenso, sagrado e profano.
Foto: A parede pintada de verde da casa de Lorena-SP

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Setembro das Mercês


Setembro é bom.
Quem não gosta? A cigarra canta, a primavera se aproxima, a flor desponta, o sol se enobrece. Eu sempre gostei. Quando criança esperava setembro e as luzes enfeitando as barraquinhas no Largo para a festa de Nossa Senhora das Mercês. Era bonito ver o jardim, as árvores e os cordões de lâmpadas, da janela no sobrado da rua Dr. José Mourão, 164. Setembro era e é bonito em São João del Rei.
Num dia de setembro à tarde, fui brincar na pracinha e tinha hora pra voltar pra casa: assim que as luzes das barraquinhas se acendessem, ditou meu pai. Eu me distraí e voltei muito mais tarde do que o combinado. Levei uma bronca como poucas vezes na vida e aprendi que deveria prestar mais atenção às luzes.
Num dia depois da novena, fomos para as barraquinhas. Eu adorava a barraca do aviãozinho. A brincadeira era apostar uma ficha num país da mesa redonda e o aviãozinho de lata colorida tinha que parar no tal país para se levar a prenda. Geralmente um frango assado de padaria em meio a alfaces e fios de ovos ou uma garrafa de vinho tinto. Eram prendas doadas por vizinhos, simples, o negócio era ajudar nas despesas da festa das Mercês. E então girava a hélice, o aviãozinho com sua luzinha levantava vôo diante de vários olhinhos admirados - não voava muito alto, era preso - e voava em círculos, rodava, rodava e a gente torcia, torcia para ele pousar e parar no país escolhido na grande mesa-mundo. Fecho os olhos e posso ouvir o som do motorzinho e as crianças gritando o nome dos países escolhidos. Rússia!!! Ali o aviãozinho parou e com sua luzinha iluminou o nome escrito em vermelho. Ganhamos um frango. Depois de algumas apostas, papai percebeu que a mesa estava tombada para um lado e o aviãozinho só parava nos países deste lado. Nesta noite voltamos para casa com 3 frangos e duas garrafas de vinho, às gargalhadas, não pelos prêmios, mas pela descoberta dos países tombados na mesa-mundo!
O dia maior da festa, 24, era muito esperado. Alvorada, banda, sinos, fogos. O andor rodeado de flores. Naquele tempo Nossa Senhora das Mercês parecia ter os braços mais abertos... Ou eu parecia ter mais fé? Ela descia as escadarias da igreja com seus cabelos de cachinhos balançando. O hino, cuja letra nunca mais esqueci, era cantado pelos fiéis e a banda executava também a Marcha das Mercês. Assim que ela acabava de descer o último degrau eu corria para casa, para a varanda de trás. A procissão passava pela rua Resende Costa e por cima do muro dava para ver só as luzes da sua coroa. Eu acompanhava aquelas luzes até elas desaparecem na inclinação da rua. Por fim, a chegada da procissão, a emocionante benção aos enfermos no hospital, a subida das escadarias com os fogos pipocando por todos os lados num conjunto de luzes coloridas iluminando o largo, o céu e meu rosto. Todo ano é assim, em setembro!
É um presente o ano ter sempre setembro.
Desejo pra você, amigo de ‘Ambição’, um mês 9 cheio de luz e encantadores pequenos momentos da vida!


Foto: Imagem de Nossa Senhora das Mercês por KK

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Livre


Raio veloz, voraz, atrevido
Nasce onde não permanece e esquece
Cai onde não carecia e assombra
Clareia para desorientar ou centrar

Aonde o sol alcança a noite
De onde tange o rio debaixo da travessia travessa do arco-íris
Quando o domingo se faz curvo
Aonde aponta a impossibilidade lógica do infinito

Luz acesa, labareda, exatidão
Concordar ou não?
Revelar em versos ao som da boca
Exalar sublime na respiração

Vaga também na falta de lucidez, na admirável incerteza do sonhar
Desenhado em tela, tragado numa refeição, em obra esculpido e traduzido
Sentimento, razão, profanação, singelo ato também pecador
Refinado e natural fato, na imaginação toma forma, contorno e cor

E não obedece o corpo porque acorrentados estão teus pés
Grito que ecoa somente nas veias, ninguém escuta
Canção de melodia desencontrada que não se ouve nem sutilmente roça a pele
Uma rima que nunca virou poesia, apenas sorriu os lábios numa graça íntima

Revira os olhos, congrega as mãos, sobe a pressão e palpita o coração
É só seu se quiser, nunca se revelará completo
Mas ruborizou a face, emudeceu a boca, escapou pelos poros em raro odor
Dirigiu sem rumo num passo curto e subiu, sucumbiu, sumiu

É da janela que ele sempre decola
E nas palavras se concretiza
Nos gestos vive
Sobrevive num mergulho luxuoso em sua memória


Voa, voa pensamento!
Só porque você é livre!
Foto: Vista do mirante da Baía dos Porcos- Morro Dois Irmãos- Fernando de Noronha, por KK

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

São-joanidades por uma são-jólatra*

- As igrejas, capelas e passinhos
- Os sobrados antigos com suas beiras e eiras
- Picolé do ‘Seu Amado’
- Churrasco do Ramon com aquela maionese caseira
- Amendoim torrado do Senhor Expedito ‘O velhinho do amendoim’
- Canelone da Cantina do Ítalo
- Procissões de Nossa Senhora das Mercês e Nossa Senhora do Carmo
- Chouriço do Penna’s Bar
- Quaresma e Festa dos Passos
- Semana Santa com suas tradicionais e bem preservadas celebrações
- Bolinho de feijão e moela com mandioca do Bar Antônio José
- Feijão amigo do Espaço Livre ( a ‘Tia’ para as Insanaes)
- Filé de frango à milanesa do Zotti
- Iluminação de natal no Largo São Francisco
- Pinga com Mel do Vicentinho
- O cheiro de incenso que exala de algumas lojas, às 3 da tarde das sextas-feiras, sob o toque triste do sino dos Passos, ritual secular que ainda está vivo
- Inverno Cultural
- Lendas
- Festa do Divino em Matosinhos
- Peças de estanho
- Teatro Municipal
- Mercado Municipal
- Água das Águas Santas
- Ouvir o apito da Maria Fumaça
- Ouvir o dobrar dos sinos e as badaladas das horas
- Centenárias pontes de pedra
- Becos com nomes pitorescos
- A iluminação dos lampiões no Largo do Rosário
- Cinema no Cine Glória com aquela telona
- Broa de coalhada da Padaria Florença
- Pão com queijo e canela da Padaria Santo Antônio
- Pôr do sol na Serra do Lenheiro
- Lua cheia no meio das palmeiras do São Francisco ou sob o córrego do Lenheiro
- Cachoeira do Urubu
- A neblina no inverno
- Calçadão da Kibon lotado
- Carnaval com todos os blocos e Escolas de Samba
- Ver a banda passar no Largo do Rosário
- Bicentenárias orquestras
- Cerveja no Velho Chico acompanhada pela bela paisagem do Largo

E tantas outras coisas que eu esqueci ou que não existem mais... Sinta-se em casa pra listar suas são-joanidades também!
E para você que não é de São João fique à vontade também pra nos contar o que é que tem de único na sua cidade natal! Porque não importa o que, mas tudo que nos remete às nossas origens por mais simples que seja, nos enche de uma alegria saudosa, daquelas capazes de iluminar um dia!

*A expressão ‘são-jolátra’ foi citada por uma querida, a Dani Cunha, irmã de outra querida, a Déia. E adivinhem quem ela chamou de são-jólatra? Claro que eu, né gente???!!! =) E o que eu pude entender é que uma são-jólatra, é uma pessoa totalmente apaixonada por São João del Rei, que nutre por sua terrinha um sentimento sem freio e cego que beira o vício, a loucura. Mas do bem, assim digamos uma mistura sagrada e profana, no melhor estilo são-joanense de sentir!

Em tempo: A partir de hoje só publicarei fotos minhas. É que ando com medo da tal lei de direitos autorais. Não que meu blog seja muito visitado, tadinho, mas vai que um destes fotógrafos que eu tanto admiro e respeito (afinal sempre coloco os devidos créditos e links para página do referido) cismem em encrencar comigo e com minha inocente ‘Ambição’, não gostaria disto. E mesmo porque é muito chato mesmo você num belo passeio pela net se deparar com uma obra sua publicada por aí sem sua autorização! Agora, as fotos que eu já publiquei, ahhh... não vou apagar não, tá tão bonitinho assim, só mesmo se eles encrecarem...

Foto: Detalhe da torre de São Francisco de Assis e palmeiras, por... KK

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Depois da neblina


Imagino a neblina do inverno como uma moça triste que usa sempre um xale cinza de um pano muito fino. Ela anda sempre curvada, de cabeça baixa e mora num lugar que fica num morro muito alto, onde o cume claro, nunca se vê por causa da neblina.
Ela é estranha, aparece, visita a cidade e depois some. Em julho sua presença, meio sutil meio densa, é quase diária. As manhãs são dela, de intensa serração cobrindo todo o vale, a fazendo sorrir com uma sensação boa de aconchego e poder. Lá fora, tudo translúcido evidenciando todo o frio de mais um inverno e ela no seu canto, com o xale sempre por cima, admirando a bela paisagem.
“Neblina que baixa, sol que racha”.
Passou julho e ela já sente falta da cidade. Em Agosto a neblina vai ficando cada vez mais rara até não se avistar mais. Não irá mais planar por aquelas ruas, aquela praça do cruzeiro e do bar, a Capela de Nosso Senhor do Bonfim, pelos becos prosaicos, ao longo do curso do córrego, correndo leve pela grama e saltando as pontes de pedra.
Alguém sentirá sua ausência?
Neblina baixa e passa.
Ela sentirá falta de cada um destes cantos, nos seus mínimos detalhes, nos seus cheiros, sabores, tons e sons. Do piar da coruja na palmeira. Do céu estrelado em noite de lua cheia, igual a qualquer céu estrelado, mas diferente na moldura com a serra do Lenheiro, as torres das igrejas barrocas e telhados coloniais. Ela, egoísta, queria só para ela as estrelas e a lua encobrindo tudo acima da cidade.
E como soprava alto o vento de julho...
Deste uivar ela não sentirá falta. O que aqueles ventos pareciam dizer? Era uma vaia? Era um choro? Um grito de socorro? Eram os três e mais um adeus ácido que ecoava suas dores.
Para que tanta neblina a turvar as manhãs?
Ela tem culpa de ter em sua essência o desapego?
Ela planta a mágoa em nós, pobres personagens do frio. Ela faz ressurgir frases tenebrosas e as propagam dentro da nuvem própria de cada um de nós, num reviver doloroso. A neblina ainda não aprendeu a flutuar com cuidado, não sabe dar a mão às coisas que são sólidas, ela se desfaz no ar em gotas frias. Não sabe se olhar no espelho sem a névoa dos deslizes abruptos e nos arrebata caindo em nebuloso desatino para depois dar lugar ao sol que racha, que brilha, que queima.
Já reparou que algumas verdades sólidas em que acreditamos por muito tempo, em certos momentos da vida, em madrugadas de inverno, elas se desfazem no ar? Todo mundo já confiou na solidez de uma neblina, na sua resistência, na sua inabalável candura. Mas ela é fraca, tem uns pontos negros grudados não se sabe onde, e os vai arrastando pelos caminhos.
Numa das suas últimas aparições, soprou o vento forte de julho e arrancou uma flor de um galho de ipê. Era um ponto luminoso e mágico, renascentista, de quem nasceu num buquê alto de um galho retorcido e feio, despido de folhas. A flor do ipê dançou no meio da neblina, a coloriu de amarelo.
Não se pode alimentar redemoinhos de pontos negros, eles -mesmo miseravelmente pequenos- deixam tudo cinza. Como não se deve iludir com verdades palpáveis.
A neblina pretende voltar, melhor, mais consistente talvez. E para ela a cor da esperança é amarela, em agosto!

Escrito em julho de 2005, editado em julho de 2009*


Em Vila Velha: somente uma brisa fresca, uma maresia já que estou tão perto do mar. E esta brisa fresca traz consigo pó de minério, porque nem tudo é perfeito e tão perto também temos a Vale! O pó incansável deixa móveis e tudo mais com uma fina camada cinza escura, por mais que se limpe... Mas o sol, amarelo, reina pleno todas as manhãs!!!

*A gente não vê mas canetas, lápis e teclas de computador têm asas....

Foto: Ipê amarelo da Estação Ferroviária por Rodrigo Vicentini

terça-feira, 14 de julho de 2009

É cultural


A noite caiu estrelada e muito fria. No Largo do Rosário pairava uma sobriedade, mas cadeiras empilhadas, caixas, panos e refletores cochichavam para quem passava que algo ia acontecer. As pessoas chegavam aos poucos, tímidas e encolhidas. A Cia Teatral ManiCômicos e o grupo musical Martelo de Pano iniciaram o espetáculo ‘Domdeandar’ baseado em pesquisas sobre oito cidades do Campo das Vertentes. A platéia era em pequeno número ainda e tinha olhar meio desconfiado. Á medida que a encenação ganhava enredo, movimento, e a música quebrava nossa rigidez, os sorrisos foram pipocando aos poucos, começando pelas crianças naturalmente. A história passava por nossas raízes, nossa gente, contava o delicioso cotidiano que conhecemos, o jeito simples de ser e de se relacionar, as lendas que ainda contamos, as fofocas que ainda escutamos, narrava nossas peculiaridades. Da igreja histórica de Matosinhos que foi demolida aos poucos, do legítimo rocambole de Lagoa Dourada, do tear de Resende Costa, dos turistas que nos visitam, mas enfim da nossa busca, caminhando sempre, com tropeços, loucuras e mazelas, guiados pelo amor! De repente estávamos todos hipnotizados, congelados num frio de sete ou oito graus talvez, embevecidos na arte. A dramaturgia havia nos atado pelo braço da identificação. E gargalhamos, nos divertimos, nos entreolhávamos e no fim aplaudimos entusiasmados de pé com o coração cheio de vida. O largo estava tomado, surgiu gente de todo lado, com cachecóis coloridos, boinas estilosas, botas e casacos, total clima de 22° Inverno Cultural da UFSJ.

Este ano o evento homenageia o pequeno Grande mineiro Otelo, teve a realização também comprometida pela crise financeira internacional e foi reduzido a uma semana de apresentações e oficinas. Então é isso, só essa semana pra curtir espetáculos, shows, exposições e outras apresentações culturais. Confira a programação!
Nosso inverno é gelado, é lindo, tem cores, agitos, afetos, artes, cheiros e sabores. Pulsa dentro de nós um refinamento, percorre essas ruas de paralelepípedos um vento rebuscado, uma rica melodia que denuncia, assim genuinamente nós somos, é cultural!







Foto 1: Espetaculo de Rua 'Domdeandar' Largo do Rosario, por Paulo Filho

Foto 2: Cortejo de Abertura do 22° Inverno Cultural da UFSJ, por Andre Fossati

Foto 3: Exposição 'Grande Otelo: Identidades em transito'. Curadoria e cenografia: Marcia Moon Local: Centro Cultural da UFSJ, por Netun Lima

sábado, 4 de julho de 2009

Como poderei viver sem a sua companhia?

Uma companhia virtual que te conecta com o real quando se deseja. Ta tudo ali em www, agora, tudo junto e cibermisturado.
Nasci kkfreitas@hotmail.com, mas hoje sou de gmail e também yahoo. Não existe mais aquela desculpa de que perdeu o contato, eu tô no Orkut, Facebook, Twitter, Youtube, Flickr, Skoob, falo com todo mundo no MSN e Skype. Tenho contatos que provavelmente nunca vou conhecer pessoalmente, mas troco idéias, fotos, comentários e faço compras. Eu já encomendei via web bolo decorado, comprei bolsa, bijuteria, livro, edredom, lençol, cobertor, maquiagem, camiseta, computador, reservei passagem de avião, pousada, me encantei com a raça Bulldog Inglês e achei meu grande companheiro Monti. Tem gente que até estuda, joga e namora.
Eu leio notícias no Uol, Gazeta On-line e Folha das Vertentes. E também ouço a Rádio São João quando estou em outra cidade.
À nossa disposição um universo de informação em incontáveis sites e comunidades, é só perguntar ao oráculo virtual de plantão nas ferramentas de busca como o Google. Faço parte de um grupo virtual muito ativo no YahooGrupos, das minhas insanas irmãs, por ele descobrimos a cada dia, a cada mensagem, que nossa amizade é viva e se consolida verdadeira, eterna! Meu TCC foi, claro, sobre jornalismo on-line! Na infindável blogosfera eu faço presença com esta ‘Ambição Literária’. E não saio de casa sem ver a previsão do tempo, sem escolher o melhor caminho e sem ver a lista de filmes em cartaz no shopping. Não enfrento mais fila pra pagar conta. Perdi o último capítulo da novela? Vejo na tela do meu computador. Quero uma música antiga de um filme pouco conhecido? Eu acho e baixo. E quem não baixa??? Vai, atire longe o teclado quem nunca se emocionou com um daqueles e-mails em formato pps!
Pare, pense e reconheça: Como pode um peixe vivo viver sem navegar e cair nesta rede?
O mundo está no ciberespaço, dá pra ver tudo da janela que está na sua frente. Você está neste momento on-line! Diga ‘oi’ e aperte ‘enter’!

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Como ela é

Ela é tímida e por isso aos olhos de muitos é arrogante. Mas é simples, ama a vida nos seus detalhes mais singelos, mais cotidianos e naturalmente simples. Gosta de falar com Deus, bordar flores, tomar café com sequilhos, ver filme romântico, novela das seis e aprender a falar francês.
Tem uma saudade enorme de todas as conversas que não teve com os pais. Vai sempre sentir falta do frio, do cheiro, das ruas, dos sinos e do entardecer da bela terra onde nasceu. Lá sonhava morar e envelhecer num sobrado que virou museu, e agora?
Ela queria sorrir mais e bater papo com qualquer pessoa pela rua, mas ela (introvertida) não é assim. Se não é de prosa, é então de poesia, de ouvir história, de música bossa nova e samba de Cartola.
Apaixonada: Pelos irmãos, pelos sobrinhos, sobrinhas e um bulldog. Gosta de ficar na janela para ver a chuva chegar e perfumar o ar com aroma de grama molhada e à noite ver a lua inundar o vale ou com sorte fazer um pedido à estrela cadente. É de surpresa, o que der na telha, de veneta, de viajar, andar no mato até a cachoeira dos seus desejos. Mas é também de razão, de ponderação, de querer comer mais trufas de chocolate, mas ficar apenas com duas ou três. É às vezes de sonhar até a imaginação permitir ou até o dia raiar. E também de saber a hora de deixar certos sonhos de lado, no telhado.
Ela tem na lembrança um gosto louco de madrugada e no presente um beijo doce de manhã.
Aos amigos dedica tempo, carinho, divide dores e também segredos. Divide o ombro, oferece o braço, o consolo e o perdão.
Não dá para ser tudo, ela sabe, mas dá pra buscar dias mansos, de sol e mar, de risadas. Não dá para acertar sempre o tom, mas dá pra buscar respeitar a composição do outro nas suas limitações, desafinos e defeitos. Não dá para ser feliz em todos os momentos da vida, mas dá pra buscar renascer em um segundo, procurar ajuda, mudar o que está errado e enxugar as lágrimas. Não dá para ser o que se deseja, mas dá pra ‘buscar ser’ na medida do possível e às vezes do impossível.
Ela sabe que há de se ter também sorte, bom humor, cultivar boa saúde, a fé na vida, no amanhã! E há de se plantar sabedoria para colher vitórias, mas também lidar com as pragas, frustrações, perdas e tempestades de granizo.
E assim ela vai descendo e subindo o morro, sem usar salto alto para não cansar os pés, sem esperar a compreensão de todos, mas com um brilho no olhar, um grito na garganta, um feitiço na manga, um coração disposto e um arco-íris no bolso.
Melhor ser um dia de cada vez, assim ela é!

Foto: A rica grade portuguesa do sonhado sobrado dela em São João del Rei, por Kiko Neto

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Sentença que não se aceita e fim

Manhã de quinta pós-carnaval. O celular no silencioso. Nunca ligavam àquela hora, mas se acontecesse, não queria que tocasse no meio da aula, é muito chato. Não sei porque resolvi olhar. Uma chamada não atendida. Era a Lê, minha amiga. Estranho. Resolvi ligar, devia ser algo relevante. Era. Ela me contou sobre a Roberta. Aos 27 anos, casamento marcado, ela foi encontrada no seu banheiro em meio a lençóis e remédios. Era bonita, cabelos longos, lisos e pretos, lábios muito vivos. Determinada. Falava alto e tinha voz rouca, entende? Risada espalhafatosa, mas risada de verdade, aquelas que se dá com vontade e se dobra para trás. Deu para imaginar como era pessoa de presença?
Não lembro como nos tornamos amigas, mas era bom. Ela fazia calda de chocolate e colocava em cima do biscoito Maria, mania. Eu lembro exatamente o jeito como ela arrumava os fios de cabelo da sua franja. Na nossa famosa foto de 15 anos, era a única de luvas e pose de modelo, timidez ela nunca soube o que era. Inteligente. Trazia consigo a audácia, a polêmica e a arrogância, tanta que às vezes até irritava. Sua nota tinha que de ser a melhor e era. Uma vez a desafiei para um teste de conhecimentos gerais com 40 perguntas, coisa de criança. Nem precisa dizer que ela se saiu melhor, fiquei com cara de boba.
Lembro de uma madrugada que me encontrou triste e aconselhou: Não dependa de ninguém para ser feliz, busque construir sua própria felicidade! Gravei a frase na alma, pelo conteúdo e pelo carinho. Mas e ela, não lembrava mais desta frase?
Batalhou o sonho de ser promotora, estudou muito, perseverou, sacrificou sábados de sol, noitadas com a galera. Conseguiu, venceu! Tequila na comemoração. Estávamos todos orgulhosos dela. Foi profissional notável, destemida, exagerada e repreendida, seu jeito, enfim. Comprou briga até com prefeito. Tinha um Brava, era da pá-virada e fazia barraco por ciúmes sim. Mas iria se casar. Essa é a Ró, sempre será, minha amiga. E essa é sua história.
Ficam as saudades especiais, gostosas, destas que só se tem quando se passa uma adolescência inteira juntas. Tantas viagens, conversas e segredos. O último encontro foi no teatro, monólogo de Elisa Lucinda, estava de férias, feliz. Repito e grito: Estava feliz!
Que estúpido, Ró! Estou com raiva de você, estou com dor, estou sem te ver!
Não pude ir... Dizem que estava serena, de terninho azul. Margaridas no pescoço.
Incrédulo! Fui no outro dia e vi as muitas coroas.
Que impotência! Que angustia não entender!
A Karine, outra amiga, ligou para desabafar, se sentia um pouco culpada.
“Nos distanciamos, talvez com uma única conversa tudo se resolveria...” chorou ao telefone. Mas você Ró, se apresentava sempre tão forte, tão enorme, tão muralha, como imaginar que algo tão violento estivesse tomando sua mente?
Para você, uma Ave Maria e minha eterna lembrança. E para todo mundo, um aviso: Por favor, estou aqui, se algo te aflige, vem e me conta!

Escrita em 2002, ano em que ficamos sem a Ró.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

De papel no céu

Esses pássaros de papel... Bailam no fim da tarde num céu tingido de anil e com nuvens de fogo. Bailam para você e para mim! Bailam em bandos nos arredores da Gameleira, Araçá, Águas Férreas, nas escadarias das Mercês, bailam nos morros, do Bonfim e Senhor do Montes, bailam. É dança embalada pelo vento, ao sussurro do vento, o vento como par. Corta o céu em pontos de outras cores, em vôos ligeiros e faceiros, alucina os meninos, desperta o encanto da infância nos adultos. Festa do firmamento, alegoria do outono, animação matreira nas alturas da minha cidade.
Esses lúdicos pássaros de papel, eu lembro... Estão no chão do corredor, na linha de montagem, a tesoura vencendo a seda em cores vivas, a cola branca unindo, facas afinando gravetos, as linhas transpassando, amarrando e arrematando, as tiras de plástico ganhando nós numa longa calda franjada, a lata de óleo vazia que se torna grande carretel. Meninos em algazarra, o sorriso é fácil, tecem planos de vôo, desafios, manobras. Eu sou menina não posso brincar, sirvo só para ajudar na decolagem. Ela, a pipa, em minhas mãos, segura e erguida pela ponta até o instante poderoso de um bom sopro de vento. E ele vem, bate, leva e nos liberta da sede de pequenos aviadores. Subimos com ela, hipnotizados, numa saborosa pressa de ganhar as nuvens. O menino a conduz, pilota com orgulho, empina, se contorce, corre, foge, busca, cruza e apenas um vence a guerra inocente. Ouço a lata de óleo cair ao chão, os braços em frenético movimento puxam o quanto podem, num ato desesperado de quem tenta salvar seu passarinho que, como filhote, não aprendeu ainda as malícias do céu. Sem maestro, sem rumo, cai papagaio na antena do vizinho e lá vai ficar num movimento de coreografia triste, conformada, sem fascínio, sem compasso, preso à solidão. É agora, em vareta de bambu e papel rasgado, o quadro da desolação de um moleque que viu o sonho de voar chegar ao fim. Não houve o regresso às mãos, de nada adiantaram seus comandos e esforços, fim da linha e no fim da linha, nada. Mas outros virão, e irão decolar, povoar os fins de tarde, flutuar, brincar e cair. Comprados no Bar do Português com o escudo do time de coração, fabricados em casa ou não, de seda da papelaria, de seda de escrever carta, de seda da caixa de sapato, ou ainda bem improvisado, de folha de caderno. Já foram em maior número, pois os brinquedos e entretenimentos de hoje são outros... Mas soltar pipa no computador não tem graça, não tem cabimento, não há como 'fabricar' tal sensação, não existe esse jogo.
Então olhe para o céu, é julho, temporada dos pássaros de papel!

domingo, 31 de maio de 2009

A pombinha branca

Imaginem... Se possível for!
O Circo do Sr. Perry instalava-se nos arredores, centenas de barracas eram montadas, como também era grande o movimento de vai e vem de carros de boi. Dezenas de famílias ficavam acampadas em casinholas improvisadas, cabanas de capim, numa verdadeira mudança provisória para o local. Alugar casas para os três dias de festa também era comum para famílias de romeiros que chegavam das fazendas e vilarejos de toda a redondeza. Também havia cavalhadas, bailados e corrida de touros (oi?)! Notáveis barões e coronéis doavam grandes somas em contos de réis para a realização da festa nos moldes tradicionais. Nos restaurantes e botequins, por preços razoáveis, eram servidos jantares, almoços, ceias, sopas, cafés com sequilhos, vinhos, licores finos e doces de toda sorte. À Estação Chagas Dória, chegavam cerca de 42 trens diários, com volume estimado em 11 mil romeiros por dia! No lado profano, como sempre há, o imponente Pavilhão de Exposições acolhia animado restaurante, teatro de fantoche e também jogatinas de roletas entre outros jogos de azar.





O posto de “Imperador do Divino” era uma grande honra, sua tarefa era promover a festa. Um dos memoráveis imperadores foi o de 1810, Coronel Inácio Correa Pamplona, tido como o terceiro denunciante dos Inconfidentes. Já o Imperador perpétuo, escolhido pelos comerciantes e pelo povo, era Santo Antônio. No dia que antecedia a grande festa, um folclórico cortejo saia do Largo de São Francisco com a imagem do Imperador Perpétuo conduzida em rica e adornada liteira. Banda, congado, bandeiras e fiéis acompanhavam o cortejo até a igreja onde acontecia os festejos. No terceiro e dia maior da festa, alvoradas festivas, congados e levantamento de mastros, missas, dança das fitas, apresentação de pastorinhas, chegada de reis e rainhas, cortejo imperial, retretas, coroação do novo imperador e finalmente, grande procissão do Divino Espírito Santo com despedida dos congados, descida dos mastros e foguetório de encerramento.

Conseguiram vocês visualizar todo este esplendor acerca dos festejos do Jubileu do Divino? Pois era exatamente assim, com toda a pompa e dimensão, a Festa do Divino Espírito Santo de 1774 até 1924 no bairro de Matosinhos. Era concedida indulgência plenária, autorizada pelo Papa Pio VI, aos fiéis que, em um dos três dias de Pentecostes, tendo confessado e comungado, visitasse a igreja de Nosso Senhor Bom Jesus de Matosinhos da cidade de São João del-Rei, diocese de Mariana, Minas Gerais.
A suspensão da festa como tal foi ordem da Conferência Episcopal da Província de Mariana, com drástica resolução do Rev. Bispo de Mariana, Dom Helvécio, em 1923. A alegação era que a festa tinha tomado grandes proporções e era comum surgirem brigas, práticas de roubos e frequentes excessos com jogos de azar.
Para sorte nossa, desde 1998 a festa foi resgatada por um grupo de pessoas lideradas pelo artista sacro Osni Paiva e pelo pároco de Matosinhos, Padre José Raimundo da Costa. Assim se tenta, ano após ano, manter as mesmas tradições, com uma outra e maior igreja de Matosinhos (a antiga foi demolida em 1960), sem o Pavilhão de Exposições Artísticas (também demolido), sem corridas de touros, e sem 42 trens diários desembarcando milhares de romeiros na Estação Chagas Dória, mas ainda com o cortejo do Imperador Perpétuo em liteira saindo do Largo de São Francisco, com muitas barracas de comidas típicas na praça de Matosinhos, jogos de azar eletrônicos (proibidos, mas tem sim!) muitos congados, folias do Divino, apresentações de grupos folclóricos e... O povo, incansável na fé do Divino Espírito Santo.

Dia 31 de maio de 2009 - Dia de Pentecostes
Espírito, Espírito, desça-nos como fogo, vem como em Pentecostes e renove a todos nós!

Foto1: Antigo Pavilhão de Exposições Artísticas de Matosinhos (Guia das Vertentes)

Foto2: Cortejo do Imperador Perpétuo (a imagem de Santo Antônio é transportada dentro desta Liteira) - Foto do portal 'O grande Matosinhos'

Fontes: Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São João del Rei-volume IX, 'O grande Matosinhos' e 'Portal do Divino'

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Anjos e Demônios



É melhor que "O Código da Vinci"!
É melhor que "O Código da Vinci"!
É melhor que "O Código da Vinci"!
É melhor que "O Código da Vinci"!
É melhor que "O Código da Vinci"!
É melhor que "O Código da Vinci"!
É melhor que "O Código da Vinci"!
Eu acho que o simbologista Langdon é boiola...
Eu amei o modelito da cientista Victoria Vetra 'para ver o papa'! Arrasou!
Eu não li o livro mas quem leu diz que 'Anjos e Demônios' é anterior ao 'Código da Vinci', mas na adaptação para o cinema, os roteiristas fizeram como se 'Anjos e Demônios' fosse uma sequencia de 'Código da Vinci'. E isso não tem a menor importância.
E eu na condição de futura beata, carola, seguidora de todas as novenas, integrante do apostolado da oração, filha de Maria, carmelita, mercedária, irmã do Santíssimo Sacramento, Boa Morte, Passos, São Miguel e Almas, rogo: sejamos benevolentes com a Igreja Católica! Amém!



quarta-feira, 20 de maio de 2009

Arrepender

Ato não experimentado
Pouco pensado, mal pesado
Obra de mãos insensatas com mente perturbada
Minuto perverso
No caminho da ética, desvio

Momento imponderado
Pouco meditado
Fazer não mensurado
Infortúnio dos passos
No caminho da retidão, desventura

Agora há que se rever
Nas esquinas da consciência
Vai a culpa roer os ossos
E assim se auto-julgará merecedor da pior pena
No caminho da lisura, loucura

E qual vergonha?
Querer voltar, quando não há retorno?
Desfazer o que cometido, feito está?
O mundo gira sem tecla auto-reverso
Na curva do desapontamento, que desculpa?

Nada fácil este exame
É árduo e até longo
Jamais bastará reconhecer o erro
Necessário ir além e assumi-lo com repugnância
Na curva do arrependimento, asco

Digno é o ‘arrepender’
Medíocre o lamento
muitos ou grandes são os pecados
multiplicados sete vezes sete
Na vala da vergonha, penitência

O corpo é todo súplica
Implora por graça
Tomba a fronte, purifica-se
Deseja tornar impossível praticar novo mal
No alto da flagelação, perseverança

Ser recebido como filho pródigo
Experimentar a leveza, a limpeza
Ter saciada a sede de paz
Sentir-se criatura abençoada, coroada
No caminho da reconstrução, a onda terna do perdão!

Escrito em 1999, editado em 2009.

Foto: Córrego do Lenheiro e ponte da Cadeia por Kiko Neto

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Clens e tenténs

A atriz Suely Franco, durante sua estada em São João del Rei para gravações das cenas externas do longa ‘Uma professora muito maluquinha’, comentou: “A cidade é muito bonita, as pessoas muito calorosas, mas como toca o sino!”
Ora Suely Franco, esses dobres e repiques são nossa riqueza e nosso orgulho! Para quem vive nas grandes cidades talvez seja mesmo um tanto difícil se acostumar ao ‘som’ dos sinos, há que se aguçar os ouvidos tão maltratados por buzinas de trânsito engarrafado, sirenes de todo tipo a todo instante. Claro, compreensível o impacto causado pela variedade e intensidade dos toques, clens e tenténs, mas eles nos são imperturbáveis!
Daniel e Raimundo Nonato
acordam Conceição
Francisco de Borja, presente de marechal, já dobrou
E Jerônimo repicou
Condenado e preso ficou São Pedro de Alcântara
Vem das torres tal prosa de bronze
O pequeno chama, sininho
O médio pergunta, meião
O grande responde, sinão
Principiadas e terentenas
Dobres e repiques
Cléns e tenténs
Canjica queimou e Senhora é morta
É o sineiro quem guarda esta composição no coração e traz nas mãos a arte única de tangê-los. De geração em geração, passa-se essa paixão, esse ofício.
Mas como toca o sino em São João! E como ecoa este som, no vale do Lenheiro, no corpo inteiro!
Sabe, cara Suely Franco, temos muitas missas, ofícios, batizados, novenas, tríduos, procissões, enfim muitos ritos religiosos para anunciar ao são-joanense, e utilizamos do nosso mais eficaz meio de comunicação, a linguagem dos badalos. Ainda, graças à Deus, somos povo piedoso, tradicionalmente barroco.
Tenho pra mim que a senhora Suely Franco já na sua cidade grande, vai se pegar dia desses com saudades de ouvir tocar os sinos de São João del Rei!

Foto: Detalhe da torre esquerda da Matriz de Nossa Senhora do Pilar com o relógio público holandês e o sino
Fontes: "Visita à colonial cidade de São joão del Rei"(Antônio Gaio Sobrinho), "Catedral Basílica de Nossa Senhora do Pilar"(Luís de Melo Alvarenga)

sábado, 9 de maio de 2009

Ela


- Tem tanta mexerica na fruteira, vai estragar, você não come.
- Mãe, eu não gosto de descascar mexerica, deixa minha mão fedendo!
- Não fala assim... pecado. Eu descasco pra você!
- E tira os fiapinhos brancos dos gominhos? Só assim que eu vou comer.
- Tiro.
Algum tempo depois volta ela com um pratinho cheio de gominhos de mexerica.
- Toma, tá docinha.
- Ah mãe, mas você não tirou bem os fiapinhos brancos...
- Não reclama, estou me sentindo fraca, não estou agüentando.
- Desculpa mãe, vou comer... ó to comendo! E enfiei logo um gomo inteiro na boca.
As lágrimas de repente despencaram em seu rosto.
- Minha filha, você sabe, eu estou...
- Não, mãe! Não fala nada! Pára com isso! Eu te proíbo de falar isso! Disse com raiva. E ela nunca mais tocou no assunto assim como eu nunca mais comi mexerica.
Tão pouco, 19 anos de convivência! E o qual é o tempo suficiente de se conviver com as mães? Para pedir perdão, pedir conselho, pedir um colar emprestado. Para rir do passado, reclamar do presente, planejar o futuro ou só para comentar o dia quente, o último capítulo da novela, o prato do almoço, a flor nova que desabrochou no jardim da vizinha. De quanto tempo precisamos para cuidar de nossas mães e assim ‘tentar’ retribuir tamanho carinho e dedicação?
Não há o que se mensurar! Todo dia, toda hora, todo instante, com intensidade, quem não quer sentir e provar do maior amor do mundo?
Feliz dia das mães, aquelas poderosas, donas deste amor!


Ao acordar-me,
sorria fechando os olhos
-Tá na hora.
Pura de alma,
picava mamão, salpicava açúcar.
Olhar de bondade.
Terços para Nossa Senhora do Carmo.
Os outros antes,
moedas para Santo Antônio.
Gestos firmes e delicados.
Do mercado trazia flores.
Amor irracional,
bife com batata frita todos os dias!
Reservada, amiga de poucas palavras.
Torta Sonho de Valsa de sobremesa.
Simples e elegante,
flor de manacá, linho, broche, anel de pérola, carteira.
Feliz, romântica,
“E o vento Levou”, “Guerra e Paz”, “Morro dos ventos uivantes”, “Ave do Paraíso”.
Cuidadosa, protetora, orgulho só dos filhos.
Costura, crochê, arroz doce, biscoito frito e rosca do Rei.
Susto, mudança, dor e despedida. Não!
Amor incondicional.
Muxinga, éden, Edna!
Ao sonhar, nossos encontros...

Foto 1: Ela comigo no colo, 1977.
Foto 2: Ela, Edna, só não sei em que ano, com que idade.

terça-feira, 5 de maio de 2009

Pelas Esquinas 557

Irresistível! Vou publicar na íntegra a crônica de Jota Dangelo da última edição da Gazeta:

Nós, os Sanjoanenses
Como? O que foi que você disse sobre São João del Rei? E sobre nós, os sanjoanenses? Não, não, esta herança é atávica. Penetra na pele, encharca os tecidos, unta os ossos. Os que nascemos por aqui, nas fraldas do Lenheiro, trazemos no sangue algo do adobe destes sobrados vetustos. Somos parte da cantaria destes templos, nossa voz tem o timbre de sinos, mesmo nosso resmungar soa como motetos. Em parte, somos de antes, mesmo tendo nascido depois, compreende? Como? Não, não. Não importa que o tempo tenha destruído coisas que deveriam ser eternas. Elas sobrevivem na nossa memória, palpitam. Já não nos banhamos no Rio Acima, não há mais garimpeiros nas grimpas da Serra, nas betas do Alto das Mercês, esquecemos do Calaboca, mas, de algum modo, em alguns de nós, estas lembranças vivem.
Não importa que homens tenham, na sua insensibilidade, ou ganância, destruído o que foi edificado no passado. Mesmo o que os de agora nem viram, como a arcaria do Largo Tamandaré, aquele aqueduto está em nós, os que somos sanjoanenses de fato e de direito. Não importa que tenham vendido a portada da velha Igreja de Matosinhos e demolido aquele templo com a desfaçatez dos insensíveis: os sinos daquelas torres demolidas tocam dentro de nós.
Somos assim: geneticamente barrocos, coloniais, atavicamente lúdicos, buliçosos, amamos a cantoria sagrada e a profana, somos históricos, temos 300 anos, empunhamos armas na Guerra dos Emboabas, tomamos aguardente com José Matol, sofremos com Felipe dos Santos, conspiramos com Alvarenga Peixoto, frequentamos a casa de Bárbara Eliodora, batizamos Tiradentes na Capela de São Sebastião do Rio Abaixo, da paróquia de São João del Rei, estivemos contra o Imperador em 1842; pioneiros, fixamos os trilhos da Ferrovia Oeste de Minas, por pouco não fomos escolhidos para ser a capital do Estado, manejamos as máquinas têxteis, combatemos Hitler, muitos de nós foram dissidentes no golpe de 64, tivemos um conterrâneo eleito Presidente da República...
Não importa que sejamos uma cidade relativamente pobre, de subempregos: isto não nos envergonha, pelo contrário, estimula a novas investidas, não costumamos desistir, temos auto-estima, somos felizes à nossa maneira, sem dar o braço a torcer.
Sim, somos sanjoanenses. Atavicamente bandeirantes. Geneticamente mineiros, os das Minas do ouro e diamantes.
Você ia mesmo dizendo o quê sobre São João del Rei?


Em tempo: Cesar estava estudando anatomia, disciplina do 1° período de Educação Física da Universidade de Vila Velha (UVV) num certo livro. Eu perguntei, como quem não quer nada, os autores do livro e ele respondeu. E eu, toda boba são-joanense mais bairrista impossível, revelei que o tal autor 'Dangelo', era o Jota Dangelo, da 'Festa é nossa', ele custou acreditar! =)

Foto: Largo do Rosário por Kiko Neto.

Voltei a postar fotos e links, oba!!!

domingo, 3 de maio de 2009

No divã



Vá ver "Divã"!

Vá ver "Divã"!

Vá ver "Divã"!

Vá ver "Divã"!

Vá ver "Divã"!

Vá ver "Divã"!

Vá ver "Divã"!

Vá ver "Divã"!

Vá ver "Divã"!

Vá ver "Divã"!

Vá ver "Divã"!

Vá ver "Divã"!

Vá ver "Divã"!

Vá ver "Divã"!

Vá se divertir e... Boas surpresas da vida para você!

terça-feira, 28 de abril de 2009

Quende

Há muita gente que diz bala de coco. Eu falo como aprendi com minha mãe, bala quende. 'Candy' que é doce em inglês, nem suspeita que numa tal terra nascida em minas, cravada em vale, cercada por serra do Lenheiro, tem tal bala que derrete no tocar do céu da boca de tão suave docemente ‘quende’. Festa de criança tem aos montes em bandejas de três andares, enroladas em papel de crepom multicor, franjado, festivo e retorcido. Muitas vezes decepciona quando verificamos ao paladar que se trata da bala de coco ‘de supermercado’, dura, que desolação! Quando a surpresa é positiva tratamos logo de espalhar: “Hum ó, é da boa, que desmancha na boca!”. A preferida da mamãe, das tias e avó era a bala quende da Dona Dulce, que delicada já tem no nome um ‘que’ de doce. Eu não lembro da sua bala, mas da sua voz, do rosto sorridente e redondo, das medalhinhas no pescoço, da sua casa, quintal e mesinha da sala em formato de feijão. Hoje a vejo ainda na janela, da casa de esquina da pracinha do Largo das Mercês, com muro que pende linda trepadeira rosa, que tem florada em época de páscoa, que dá pro Beco do Cotovelo. Tem coisas que se perdem da minha lembrança, mas eu gosto de ir lá no fundo vasculhar a memória, buscar também em becos tortuosos essas coisas simples e enormes de boas da vida. Vou puxando pelos pensamentos e às vezes uma destas passagens surge como raio novo de sol da manhã. A Dona Dulce é uma destas lembranças, era bondosa, suponho ainda ser, servia leite ao negro Vicente que saia do Tejuco com seu terno, chapelão, boca sem dentes, mas com vasto sorriso e bule de alumínio na mão para buscar a doação na casa da Dulce. Será que o Vicente além do leite, sequer um dia provou uma bala quende feita por ela? Eu espero sinceramente que sim, afinal era a melhor, segundo minha mãe, tias e avó, eu mesmo não lembro. Sei que a tal bala branca como neve dá trabalho pra fazer, tem que misturar os ingredientes, levar ao forno, espalhar em pedra mármore e depois puxar, puxar, puxar um melado de cor marrom-guaraná até que fique branco, branco, branco tom de pérola. Guerra braçal à parte, não podia ser mais divina a roliça e enrugadinha bala quende.
Hoje eu compro, quando tem, na padaria da avenida, vem em saquinhos ou vasilhinhas descartáveis de plástico e elas, as danadas balas brancas, chamadas de coco têm essa magia, esse gesto desaforado e bandido, de escapar em desmaio dissolvente na boca e provocar tamanho alvoroço de prazer! Glicose às alturas e sorrisos caminho afora. Queria eu viver docemente como Dulce Mendes, por muitos anos ver as procissões serpentearem o Largo das Mercês e ser testemunha das floradas da trepadeira de mimosos cachos rosáceos do muro do Beco do Cotovelo. Será qual o segredo? Talvez vencer batalhas braçais ou não e fazer nascer balas que de tão doces doem em algum canto da gente, espantando desilusões: a quende da melhor qualidade!

P.S.: Ainda estou sem conseguir publicar fotos, itálicos, links, mas vou deixar aqui para imaginação dos caros leitores: a foto em questão era claro, do Beco do Cotovelo com a trepadeira florida. Se não der pra imaginar, passa lá...Bjos, KK

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Alongamento

Durante o feriado estive ‘em’ estado Espírito Santo, nos dias de festa da Penha. Festa assustadoramente enorme, com mega estrutura gigante. Enquanto reunimos aqui em São João del Rei cerca de 3 a 4 mil no Descendimento da Cruz, guardadas as devidas proporções populacionais, as romarias da festa da Penha atraiam cerca de 110 mil fiéis! Isso em cada romaria, e tinha dia que eram duas romarias. Era a romaria dos homens, das mulheres, dos deficientes, dos motoqueiros (essa um tanto barulhenta), enfim romaria para todos os tipos e tribos. Fora o povo que desce e sobe, sobe e desce, a ladeira misericordiosa da penitência durante os 7 dias da festa. Eu que adoro, também subi a ladeira até o convento da Penha.
Mas neste post quero falar de flexibilidade. É que li em crônica da revista do jornal capixaba ‘A Gazeta’ sobre o assunto e me fez lembrar de uma amiga tinhosa que só bebe coca-cola light! Nem água ingere!
A cronista Maria Sanz nos instiga a praticar a flexão dos próprios conceitos, para senão modifica-los, deixa-los ao menos alongados. Alongar é coisa que essa minha amiga tinhosa sabe que é bom, afinal é médica ortopedista e até já me ensinou alguns alongamentos para deixar meu joelho mais feliz! E deixa, quando eu os pratico!
Sanz ressalta a importância do exercício para, basicamente evitar o sofrimento que é a conseqüência imediata da cegueira imposta pelo cabresto do pensamento enrijecido. Se a minha amiga praticasse o tal exercício de flexibilidade dos conceitos experimentaria um dia pedir um suco de abacaxi com hortelã ao invés da coca-cola light. Ou pelo menos não compraria tamanha briga com o pobre garçom que trouxesse coca zero ao invés de light, mesmo porque light não é zero, não é amiga? É bom optar por coisas novas, provar da liberdade de escolha e assim passar por esta vida com boa bagagem de sabores, lugares, ângulos, pessoas, ideologias, sentimentos e prazeres diversos. E olha que quem vos escreve é pessoa sistemática, capaz de passar semanas comendo exatamente as mesmas coisas num self-service, anos só McFish, a adolescência inteira tomando só coca-cola (é, já fui viciada) e depois migrar para a água tônica e ficar nela até hoje, mas... descobri também o sabor único do suco de abacaxi com hortelã, porque um dia me deixei flexibilizar! Ah querida amiga tinhosa, como é bom o suco de abacaxi com hortelã, tão refrescante, bem coadinho então, hmmm! Se liberte das amarras deste refrigerante manipulador e descubra um mundo além do sabor industrial e gaseificado da folha da coca! E entenda que há outras formas de ser feliz, é nisto que está o grande barato da vida, a diversidade. Sejamos espíritos livres e tomemos sucos de abacaxi com hortelã!

Ainda é 23 de abril, então salve Jorge, de Capadócia, que sentou praça na cavalaria. Fez história derrotando dragão, assim ele escolheu, e hoje em oração peço que me cubra com suas armas para que meus inimigos tenham pés e não me alcancem!
Que amanhã os deuses internéticos conectados escolham por sanar os erros da minha interatividade blogueira e me livrem dos malditos triângulos amarelos com pontos de exclamação porque eu quero postar fotos e links também!!! Af...
E tenho bendito!

Insanas irmãs

A minha turma não é muito grande. Minha turma é do tamanho certo dos degraus do busco do padre José Maria Xavier, no largo do Rosário, onde tudo começou. Era brincadeira de criança, Policia e Ladrão com direito à cadeia na entrada lateral do Solar dos Neves. Podia ser Queimada ou uma inusitada versão do Sítio do Pica-pau Amarelo ou da minissérie Hilda Furacão. Tão boas lembranças, de festinhas, de passeios, de férias, de lanchinhos.

As crianças cresceram, tornaram-se meninas, moças, advogadas, fisioterapeutas, administradoras profissionais e outras, do lar. Hoje são bárbaras mulheres, belas, angelicais e também insanas. Outras são doces até no apelido. E gostam de farra, de dar risada, de tomar cerveja, de viajar, de acampar, de namorar. Gostam de descer no bloco do Copo Sujo abraçadas, gritando até ficar sem ar, que a festa é delas mesmo que uma multidão esteja ao lado. Gostam enfim de estar simplesmente juntas, nos feriados, em São João del Rei! Já que o dia-a-dia é vivido em Juiz de Fora, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, Vitória, Campos, Rio Verde e Bagé! Oh saudade...Mas também outras estão na terrinha!

Minha turma é do tamanho de uma boa mesa de bar, para uma boa conversa, um desabafo, uma fofoca, é claro. Afinal de contas minha turma não é perfeita, é normal como qualquer outra turma de amigos. Umas se preocupando demais com as outras, querendo dizer o que é melhor para elas, se intrometendo demais quando no fundo, é a boa e velha intenção de só querer o bem dela. E sai arranca-rabo, mas sai também solidariedade na hora certa. Sai briga, mas sai aquela ajuda que você nem esperava.

E tem mais advogadas, mais fisioterapeutas, turismólogas e ainda publicitárias, jornalistas. Uma até acredita ser cronista, pode? Tem a mais bela das profissões, a de ser mãe, e ainda professora. Tem arquiteta, geógrafa, química, médica. E vem mais advogada por aí, administradora, enfermeira, professora, esposa, mãe... E chegarão a avós um dia. Verão as netas brincando no largo do Rosário ou em qualquer outro lugar. E tudo que desejo é que nossas filhas e filhos, netas e netos, tenham uma turma de amigos tão linda e especial como a nossa. Para ajudar a crescer em cada etapa da vida e assim torná-la mais interessante!

Insanae pra sempre!
P.S.: Colocaria uma bela foto da nossa turma mas o blog está com problemas na publicação. Espero que se resolva em breve!

terça-feira, 14 de abril de 2009

Foi-se

Aflora já conhecido sentimento que beira a nostalgia
Nem passeios, nem encontros, nem rituais.
O Bispo vai descansar, os pálios bordados voltam aos armários, varrem-se as flores pisoteadas das ruas, recolhe-se o rosmaninho, fecham-se as malas e toma-se a estrada.
Nos altares novamente os olhares vigilantes de santos, anjos e mães.
Festas acabadas, músicos à pé e convidados à ponta-pé!
Resta-nos devorar ovos de chocolate
sem esquecer de deixar ecoar o ‘aleluia’ em nossos dias
Cristo ressuscitou, renovemos nossa fé!
A vida não pára, o badalar das horas, meia horas e um quarto de horas, já soam normalmente na torre desde sábado e o Lenheiro segue seu curso!
Pode até chover agora, combina com esta semana.
Foto: Tapete de rua e Igreja São Francisco

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Jesus Morre na Cruz


O trecho a seguir é parte da oração da via sacra do Padre J.B. Cornaglioto. Para mim, uma perfeita descrição do momento da morte de Cristo que revivemos hoje.

Nós vos adoramos Ó Cristo e Vos bendizemos.
Porque pela Vossa Santa Cruz remistes o mundo.

Considera como, depois de três horas de agonia sobre a cruz, exala Jesus o último suspiro, entretanto que os judeus vomitam contra Ele terríveis blasfêmias. Logo o céu se vestiu de luto, o sol se eclipsou totalmente, a lua negou suas influências, tremeu a terra, partiram-se os rochedos, abriram-se as sepulturas, rasgou-se de alto a baixo o véu do templo, confundiram-se os elementos e toda a ordem da natureza se alterou, enchendo-se o mundo todo de pavoroso assombro. – Ò alma remida com o sangue de teu Deus, se as criaturas insensíveis se confundem e se assombram na morte do seu Criador, que esperas tu, que não choras e te arrependes depois de ter sido a causa de sua morte?


Fotos 1 e 2: Encenação de duas das sete dores de Nossa Senhora em exposição na igreja Nossa Senhora do Carmo até hoje à tarde. Semana Santa 2009

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Também em Matosinhos!


Semanas atrás fui procurada para fazer um freela e por alto disseram que se tratava de um jornal especial para a Semana Santa. Fiquei empolgada com a possibilidade de escrever sobre algo que admiro e que tanto me emociona, a tradicional e única Semana Santa da paróquia de Nossa Senhora do Pilar em São João del Rei. Mas como o melhor da festa é esperar por ela, na verdade as matérias que foram designadas para mim, eram o oposto do que almejava: Semana Santa em Matosinhos, Prados, e eventos paralelos, como feiras e exposições! Que jarra de água fria do poço da Samaritana me jogaram! Enfim, vamos às minhas impressões!
O visitante que escolher o Santuário do Senhor Bom Jesus de Matosinhos para assistir a uma solenidade da Semana Santa talvez não sinta, ao passar pelo imponente portão de ferro, o cheiro agradável do rosmaninho pelo chão, não vai se encantar com a beleza de uma música do século XVIII, nem tão pouco ficará sem entender o que estão dizendo por não dominar a língua latina, vai observar linhas longínquas e retas da arquitetura moderna, ao fundo se deparar com impressionante Imagem do Senhor Bom Jesus na cruz ao invés de rico altar dourado talhado com arte. Mas sairá de lá com uma certeza: “A essência é a mesma” como disse o padre José Raimundo. Estamos falando da verdadeira fé que move todos os rituais litúrgicos da paixão, sejam eles populares, atuais e simples na comunicação com a comunidade, sejam eles rebuscados e ricos de arte e tradição de mais de 200 anos. As duas formas são frutos da devoção, são braços daquela cruz, são ressonâncias daquelas passagens que atravessaram séculos e se perpetuaram. Estamos revivendo a morte e ressurreição de Cristo, todos conforme clama o coração, sem preconceitos, sem disputa. Há lugar para todos! Mesmo porque o Reino Dele é de todos! Foi no vencer da morte de Cristo que se alicerçou toda a nossa fé!
Uma Santa Semana para todos, os são-joanenses, os visitantes, os não-católicos, os cristãos, os eleitos e os que buscam a salvação!
Foto: Portão de ferro da entrada do Santuário do Senhor Bom Jesus de Matosinhos
A matéria abaixo foi publicada no Especial da Semana Santa 2009:

Semana Santa em Matosinhos

Enquanto no centro histórico as antigas e bem preservadas solenidades da Semana Santa atraem muitos são-joanenses e turistas, a população do grande Matosinhos se une no Santuário do Senhor Bom Jesus para também prestigiar a maior data católica. Com uma outra forma estética, a paróquia de Matosinhos tem programação intensa, sem tradições barrocas, mas nem por isso menos bela.
Com público estimado em 15 mil fiéis, a cerimônia mais concorrida é a Encenação do Descendimento da Cruz, realizada na Sexta-feira Santa, a partir das 20h no adro do Santuário. É quando atores relembram a cena da crucificação de Cristo, e em Matosinhos com um diferencial: uma quarta cruz é colocada, além das três já conhecidas. “Essa quarta cruz é para simbolizar as ‘cruzes’ que nosso povo carrega hoje como a violência, a fome, os maus políticos, etc” destaca o padre José Raimundo da Costa, há 18 anos à frente da paróquia do Senhor Bom Jesus. Após a encenação os fiéis participam do exercício piedoso da procissão do Senhor Morto pelas ruas do bairro.
O pároco lembra ainda que, embora tenha maior envolvimento popular, a cerimônia do Descendimento da Cruz e procissão do enterro, não são as mais importantes, mas sim a Vigília Pascal que acontece no Sábado Santo. “O povo sofrido se identifica mais com a Sexta-feira Santa, mas a celebração da ressurreição de Jesus Cristo é mais significativa para o cristão por ser a base maior da nossa fé”, explica.
Outro destaque da programação é Celebração Comunitária da Penitência, na Sexta-Feira Santa, às 9h30, no Santuário, que reúne cerca de 2 mil fiéis e é vista como uma confissão comunitária, mas na verdade não é. O padre José Raimundo esclarece que a confissão comunitária não é permitida pela Igreja, se trata apenas de uma solenidade de reflexão sobre o perdão e misericórdia divina. E somente é feita na Semana Santa em caráter extraordinário, uma vez que seria impossível atender a demanda de paroquianos que buscam a confissão nesta época. Além da Celebração Comunitária da Penitência, são realizados mutirões que incluem cerca de 10 à 12 padres para atender aqueles que desejam se confessar individualmente.
No mesmo dia acontece também a Via Sacra Pública da Campanha da Fraternidade de 2009 que tem como tema “Fraternidade e Segurança Pública” e o lema: “A paz é fruto da justiça”. O cortejo sai do Santuário e segue em direção ao bairro Bom Pastor realizando as 14 paradas para reflexão e leitura do texto da campanha. A chegada ao Cruzeiro Luminoso marca o fim da Via Sacra Pública.

A Campanha da Fraternidade também inspirou a escolha dos representantes dos apóstolos na cerimônia do Lava Pés, na Quinta-feira Santa. Serão selecionados membros da comunidade ligados ao tema da campanha, como os profissionais da segurança.

O importante é participar

As cerimônias da Semana Santa são promovidas em todas as paróquias da cidade. Cada uma organiza a festa de acordo com a cultura do lugar e pode optar por realizar ou não as celebrações para-litúrgicas (como a procissão do Encontro), mas as celebrações litúrgicas (como a Ação Litúrgica da Sexta-feira Santa) seguem o mesmo roteiro no mundo inteiro, de acordo com as mudanças do Concílio do Vaticano II. “Na paróquia de Nossa Senhora do Pilar se conserva a tradição de alguns ritos em latim, o que é uma riqueza em termos de cultura e arte. Aqui é mais popular, em todas as solenidades o idioma usado é o português. Muda a forma de celebrar, mas a essência é a mesma” analisa padre José Raimundo.
Ao cruzar os grandes portões de ferro do Santuário de Matosinhos, talvez o visitante não sinta o cheiro do rosmaninho, nem ouça uma música do século XIX, mas com certeza se encantará com outros aspectos como o destaque dado à questão social e o emocionante envolvimento da comunidade.
O importante, na visão do padre José Raimundo, é participar das celebrações da Semana Santa como um momento de reflexão espiritual relevante, cada um freqüentando a paróquia que pertence, conforme suas tradições e costumes. “Queremos insistir para que, principalmente nas cidades históricas, a Semana Santa não seja lembrada como um feriadão, reduzida ao aspecto cultural. A data vai além disso para o cristão” conclui o padre José Raimundo convidando todos os fiéis a vivenciar a grande festa que é a Páscoa.
Seis solenidades da Semana Santa no Santuário do Senhor Bom Jesus de Matosinhos terão transmissão ao vivo pela TV Campos de Minas, canal 11, e Rádio Emboabas 96,9 FM e 1480 AM.

Programa

Quinta-Feira Santa, 09 de Abril
Solene dia da Eucaristia, Sacerdócio e Mandamento Novo do Amor.
9h30-Na Catedral Basílica de Nossa Senhora do Pilar, missa do Crisma.
15h00-No Santuário, Celebração Comunitária da Penitência, orientada pelo Pe. Claudir Possa Trindade.
18h30-No Santuário, missa solene da Ceia do Senhor, sermão do Mandato e cerimônia do Lava-pés. Procissão interna do Santíssimo Sacramento e Adoração até meia noite, na capela do Santíssimo. Confissões individuais.
Sexta-Feira Santa, 10 de Abril
Jejum e abstinência de carne, silêncio e reflexão.
06h00-Via-sacra Pública da Campanha da Fraternidade 2009 saindo do Santuário e terminando no bairro Bom Pastor, ao lado do Cruzeiro luminoso.
09h00-No Santuário, celebração Comunitária da Penitência, orientada pelo Pe. José Raimundo.
13h00-No Santuário, confissões individuais.
15h00-No Santuário, solene Ação Litúrgica e Canto da Paixão.
20h00-No adro do Santuário, sermão, Descendimento da Cruz e logo após, procissão.
Sábado Santo, 11 de Abril
20h00-No Santuário, solene Vigília Pascal: Liturgia da Luz, Liturgia da Palavra, Liturgia Batismal e Liturgia Eucarística.
Domingo da Ressurreição, 12 de Abril
Cristo Ressuscitado é a base de nossa fé.
8h00-Missa no Santuário.
9h30-No Santuário, missa especial para as crianças.
11h00-No Santuário, celebração do Batismo.
14h00-Na comunidade rural do Carvoeiro, missa.
18h00-No Santuário, missa solene e procissão do Santíssimo Sacramento.

*Em tempo: a paróquia de Nosso Senhor Bom Jesus de Matosinhos não recebe nenhuma verba para a realização da Semana Santa, nem da prefeitura e muito menos da Cemig.

Foto: Fachada do Santuário do Senhor Bom Jesus de Matosinhos




sexta-feira, 3 de abril de 2009

Viver 136 anos

Essas 17 são-joanenses devotas de São Francisco de Assis viveram plácidas margeando o jardim, embelezando o monumento, assistindo estáticas às mudanças da centúria - dos costumes às máquinas; rezando terços com gotas de chuvas, vigiando o vale, bailando com o vento - ora enfurecidamente, ora valsando; numa constante busca de alcançar os céus. Foi assim durante 135 anos aproximadamente. Mas eis que uma praga, do tamanho de pragas e com a força devastadora de pragas, fez doente os 35 m daquelas imponentes palmeiras imperiais, espalhando sua desgraça, deixando podres e infestadas suas copas, envenenadas as suas seivas, manchados os seus troncos, enfraquecidas as suas raízes. Os cuidados e providências não foram à altura daquelas gigantescas e a natureza num dia de mau humor fez descer uma tormenta de novembro, e matou de vez duas delas.
(...)Duas palmeiras caíram, uma viva e outra morta. A viva caiu rasgando o telhado de uma casa ao lado. Desceu desmaiada, sangrando seiva, escalpelada de suas ramagens, humilhada no tombo causado por um sopro doido e sem direção. Caiu no rumo das águas tímidas de um córrego que de vez em quando cisma que é tsunami.
A outra palmeira caiu já morta. Era pedra cantada. Todos sabem que quem morre cai. Até ela já sabia que tinha morrido e precisava cair... só que se esqueceram de derrubar. Quem lembrou foi o vento. Esse vento que veio e... zum! Madeeeira!!! Que madeira? O que caiu foi um cadáver imperial, infectado de fim. Mas caiu imponente. Desceu do alto dos séculos sem perder a raiz.
Agora, é varrer as folhas secas.(José Antônio)
Em seguida veio a serra elétrica derrubar sem piedade as outras condenadas já desfalcadas de copas. Foi dolorosa a despedida, triste, como tristes e dolorosas são as despedidas daqueles que viveram tanto. Era como se chorássemos por parentes, conterrâneos que sempre estiveram ali no Largo a nos saldar, mesmo que nós nem olhássemos. Mas agora fere, afronta o coração, dá saudades daquele conjunto de pilares com verdes topos envergados, à noite iluminados, emoldurando a lua cheia. Com somente quatro exemplares está vazio o jardim como uma alma pecadora que ainda não se redimiu.
Que venha a revitalização, um ressurgir de vidas novas como pede esperançosa esta praça e este povo. Com verba estadual de mais de R$100 mil, Instituto Estadual de Florestas (IEF), Conselho Municipal de Desenvolvimento Ambiental (Codema), da Prefeitura, integrantes da Venerável Ordem Terceira de São Francisco, da Companhia Industrial Fluminense, da Emater, do Instituto do Patrimônio Histórico Artístico e Nacional (Iphan), dos Bombeiros, do 11o Batalhão de Infantaria de Montanha de São João del Rei, e o subsecretário de Estado de Desenvolvimento Regional e Política Urbana (Sedru), Rômulo Viegas, (ufa!) todos se empenharão para trazer ao São Francisco novas palmeiras. As mudas serão de espécies diferentes, as palmeiras reais roystonea regia que alcançam 25 metros, dez a menos que as imperiais. A justificativa da escolha é proporcionar maior segurança aos moradores do entorno da praça. Real mas não Imperial que elas sejam nobres na tarefa de povoar de exuberância novamente o lugar.
O objetivo das entidades é manter o projeto paisagístico original que foi elaborado no ano de 1850, no final do século XIX. E do qual eu tenho certeza não faz parte estes cafonas pingos-de-ouro cor de burro quando foge... ‘afemaria’, e outros arbustos sem nexo e sem flor que hoje habitam o jardim! Que venham para o desenho da Lira os manacás e magnólias a exalar perfumes! E para os netos vamos contar: Eu sou do tempo que no Largo de São Francisco existiam grandes palmeiras imperiais, muito maiores que estas que estão aí hoje, mas aí veio a velhice delas e uma praga, e depois um temporal...
Foto: Largo de São Francisco com suas palmeiras imperiais por Beni Jr