quarta-feira, 21 de julho de 2010

Bispo, titã, ovelha negra e camaleoa

Julho deste ano, sexta-feira.
Um vento calmo e devoto acompanhou o cortejo de Nossa Senhora do Carmo pelas ruas. E no céu se desenhou fogos, se fez cachoeira de pétalas de rosas nas janelas coloniais e uma bela chuva de papel picado platinado brilhou no largo.
Já o sábado amanheceu nublado, mas foi encorajado, animado e ritmado com tambores de congo, bandas, fanfarras e baterias de escolas de samba. Estava assim inaugurado o 23º Inverno Cultural com o tema ‘Paisagens Sonoras – ouvir, ver, sentir’.
No meio da tarde o frio se agigantou, mas não desanimou as centenas de fiéis que tomaram as escadarias da igreja das Mercês para assistir a posse do novo Bispo. Viu-se tapete vermelho, a imagem de Cristo Crucificado e mais de 250 padres. Ouviram-se os cânticos da cerimônia e dobres diferenciados nos sinos. Mais uma vez o vento, desta vez feroz, se encarregou de alongar tais paisagens sonoras.
Quando a noite caiu impiedosa, uma roqueira ovelha negra de família cantou o amor pop e outras coisas da vida na avenida. A multidão agora era outra e aplaudiu a Rita quando ela musicou a cidade com elogios graciosos. A paisagem que ela avistava do alto do palco era a imponente ponte de pedra iluminada, as duas ruas que ladeiam a margem gramada do córrego, totalmente tomadas pelos fãs, castanheiras enfileiradas, e o sereno cobrindo tudo mansamente. Era mesmo um cenário para conceituar de ‘muito bonitinho’. O que a Rita não viu foi a segregação involuntária não-combinada, ou pior, já prescrita no preconceito que cada um leva no peito diante da inclusão social. O Lenheiro de filete d’água foi à muro invisível e quase intransponível.


Em outra semana Arnaldo Antunes vai aportar aqui para o festival. Um artista exótico e talentoso que manipula as palavras do jeito que só se faz quando se conhece profundamente a sutileza da língua. Ele sabe orquestrar adjetivos e cadenciar rimas que culminam num descolado verso. O que ele dirá destas nossas abundantes paisagens sonoras?
O inverno de São João Del Rei assim vai se apresentando, é gelado, humano, cultural, sagrado, profano e nós são-joanenses nos adaptamos feito camaleão e camaleoa, numa boa! Nesta época os filhos caçulas como Rita Lee, talvez também ovelhas negras da família, sempre vão voltar, seja pra terrinha ou de um tombo qualquer. Existirá alguém que muito caminhou, estudou, rezou, pastoreou e tomará posse como novo bispo. Outros simplesmente vão repetir a frase do ex-titã poeta “O desejo é o começo do corpo” significando com causa ou não, o mistério mágico de nos reunirmos aconchegantes em julho.

Foto1:Posse canônica/Diocese de São João del Rei
Foto2:Show Rita Lee/André Fossati
Foto3:Cortejo de abertura do 23ºInverno Cultural da UFSJ/Netun Lima

8 comentários:

  1. O bom disso aqui é que consigo, lendo suas palavras, me sentir participando, vendo, sentindo, tudo o que vc coloca, mesmo tão distante fisicamente! Vc me leva aonde eu mais gostaria de estar! Acho que todo elogio é pouco pra vc! Um beijo, com muitas saudades!
    Ju

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  2. Enormes saudades tb Ju! Muito, muito obrigada! Fico feliz de poder 'te levar' pra terrinha...rsrs. Bjos

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  3. Lindo KK!

    Deverias publicar um livro com as tuas crônicas!

    Beijos

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  4. Que visita boa! Obrigada Lilian! Volte sempre! Bjos

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  5. Pra variar amei! Mais uma vez, emocionante!
    Bjos
    Re

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  6. Obrigada Re!!! Leitora assídua, acho chic!rsrs..Bjos

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  7. KK,
    muuuuuuito bom! Vc está cada vez melhor. Parabéns!
    Beijo,
    Raquel Prudente

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  8. Oiiii Raquel, sumidinha! Bom 'te ver' por aqui! Bjos

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