
Meu pai preferia falar de outras coisas e fazer outras coisas muito mais importantes, de acordo com seu julgamento, que torcer para um time. O que ele mais temia numa roda de amigos era que se começasse a discutir sobre as ‘últimas’ do esporte, ele certamente ficaria sem dar opinião. Durante uma partida em que todos estivessem ligados na TV reclamando enfurecidos um pênalti não marcado ou um chute pra fora, meu pai se limitava a dizer, sei lá porque: “Joga no miolo, tem que jogar no miolo”. Mas da época da Copa ele gostava, mas só porque gostava de festa.
Bom, mas pela minha mãe e pelos meus três irmãos, desde pequena eu gosto de futebol. Como é de tradição são-joanense, dois de meus irmãos torciam pelos times do Rio, um flamenguista e o outro tricolor, lembrando que o coração de todos era azul. E daí começou meu fascínio pelo clássico carioca mais comentado, mais charmoso, tenso, cheio de mandingas e histórias, o mais descrito por jornalistas como Mário Rodrigues Filho e posteriormente por Nelson Rodrigues: o FlaxFlu. A partida que mais atrai as multidões, que mais vende jornais e rende audiência. Gigante, pungente, o duelo bateu o recorde mundial de público em partidas entre clubes com 194.603 espectadores, na final do Campeonato Carioca de 1963.
Nem ‘Grenal’, muito menos ‘Bavi’ ou até mesmo o temido ‘atlético e cruzeiro’ me arrebata tanto.
Vejo a torcida rubro-negra loucamente apaixonada, aguerrida, atrevida, um amor sem regras e pudores, cheio de altos e baixos, mas presente e eterno.
Já a torcida ‘pó de arroz’ do Fluminense parece-me adorar com um sentimento mais centrado, pés no chão, contida e ausente por vezes e quando convém explosivamente e elegantemente eufórica. Posso comparar o Fla x Flu ao inesgotável debate entre e a emoção e a razão, a paixão e a lucidez. A turma do urubu é marginalizada, abrangente nas classes desfavorecidas, já a do cartola está acima, como se descendesse de família nobre, vista num pedestal social que ninguém sabe como foi alcançado.
Ah como é delirantemente tentador o furor de um flamenguista e como é agradavelmente pacificador o carinho de um tricolor!
Lamartine Babo me sentenciou que uma vez flamengo, sempre flamengo, flamengo sempre hei de ser, é meu maior prazer. Mas também deixou claro que sou tricolor de coração, sou do clube tantas vezes campeão, fascina pela disciplina, o fluminense me domina.
Nas alturas do campeonato para qual time você torce? Para o rubro-negro chegar ao G4 ou para o tricolor não ser rebaixado (se é que isto ainda é possível)?
Eu? Eu sou Cruzeiro!!!